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Computação Quântica

Computação quântica deverá trazer benefícios inimagináveis para a humanidade

Pesquisador britânico, James de Leslie, fala sobre os benefícios da tecnologia quântica

O cientista inglês Charles Babbage pleiteava financiamento para o desenvolvimento de uma potente máquina de calcular junto à Coroa Britânica e a entidades que pudessem ter interesse em suas pesquisas. Era meados do século XIX, as navegações eram determinantes para o domínio econômico internacional.  O projeto de Babbage iria potencializar a produção de cálculos das tabelas marítimas e realizar funções matemáticas mais complexas do que as disponíveis pelas calculadoras existentes. Na verdade, tais cômputos eram executados à mão, por “computadores humanos”, com grandes chances de erro nos resultados.

Babbage projetou um computador mecânico, a Máquina Diferencial, e obteve recursos do governo Real inglês para desenvolvê-la. Mais de uma década depois, sem terminar o primeiro projeto, “idealizou um upgrade”, uma máquina programável. As pesquisas em torno desse equipamento tiveram a contribuição de Ada Byron, a condessa de Lovelace, filha do poeta Lord Byron. Ada Lovelace fez contribuições que representaram as origens da lógica de programação. Conceitos válidos ainda hoje. O nome da nova engrenagem chamou-se de Máquina Analítica.

Contudo, a dupla jamais conseguiu ver a máquina operando. Babbage empregou todos os recursos obtidos durante sua vida na construção desse projeto, mas jamais o concluiu. Era impossível, com a engenharia da época, chegar a resultado tão meticuloso.

Os computadores eletrônicos e programáveis começaram a ser desenvolvidos exatamente cem anos depois de Babbage apresentar sua Máquina Analítica nos idos de 1833. Projetos nos Estados Unidos, na Inglaterra e na Alemanha começaram a receber atenção dos governos e de corporações, com um orçamento originado especialmente pelas necessidades geradas por situações de conflitos mundiais.

Hoje, com as pessoas carregando um computador à mão, está confirmada a importância da visão de Babbage e de Ada Lovelace. Mas eis que os anos passam, a pesquisa científica se perpetua e traz novos desafios de inovações tecnológicas. Os conceitos da computação quântica, ainda teóricos e fundamentados em princípios, demonstram a viabilidade de uma tremenda guinada no desenvolvimento científico. Implementados parcialmente, anunciam uma revolução tão profunda ou ainda maior que os computadores proporcionaram para o desenvolvimento humano.

Matéria do campo da Física, a computação quântica possibilitará o desenvolvimento de pesquisas nas ciências médicas, na bioquímica, na engenharia, com o desenvolvimento de novos materiais; algo difícil de imaginar, mas presente na visão do pesquisador James de Lisle.

Natural da Inglaterra, como Charles Babbage, James de Lisle trabalha na área de Física na Universidade de Osaka, no Japão e está em João Pessoa para ministrar o curso em Computação Quântica na III Escola de Computação Quântica, uma realização da Associação Nacional para Inclusão Digital (Anid), com apoio do Comitê Gestor da Internet no Brasil. Em entrevista ele esclarece os estado da arte da computação quântica:

- Afinal, o que é a computação quântica?

Lisle - A computação quântica é praticamente uma coisa abstrata; não é como computadores normais, como smartphones ou laptops. É baseado em algo que acontece preferencialmente em situações físicas muito extremas. Em ambientes muito frios, ou é executado com materiais não usuais, ou projetado por uma engenharia diferente. É difícil, realmente, para pessoas que não são físicos entender o significado da computação quântica ou porque isso é importante, mas a realidade é que a maior parte das pessoas que já estão usando tecnologias que são desenvolvidas usando pesquisa científica em computação quântica.

- Onde e como ela é usada atualmente?

Lisle - Por exemplo, na comunicação entre bancos, quando é feito uma transferência de um banco para outro banco, usa-se a criptografia quântica. Qualquer pessoa pode comprar pela Internet duas bases, conectar com um cabo de fibra óptica, e fazer uma comunicação de forma segura usando criptografia quântica ou seja, a criptografia baseada em princípios de mecânica quântica. Isso provavelmente, por enquanto, será mais próximo do cotidiano normal de pessoas que realmente vão interagir com um computador quântico.

- Então, essa máquina é tão inacessível quanto os primeiros computadores criados?

Lisle - Os principais benefícios da computação quântica é permitir os cientistas, ou químicos, ou biólogos, ou companhias farmacêuticas, a resolver problemas que nunca foram possíveis resolver antes em função da natureza fundamental de computadores que nós temos agora: eles não são aptos a resolver esses problemas. Por exemplo, entender como as proteínas falham no corpo é um ponto importante no desenvolvimento de drogas. É um cálculo difícil de fazer em um computador normal, mas, é possível em um computador quântico resolver esse problema de forma eficiente.

- Mesmo em se tratando dos supercomputadores como o Sistema Cray, e outros?

Lisle - A computação quântica é muito, muito melhor do que esses sistemas. Por exemplo, imagine ter um supercomputador, como os que conhecemos hoje; se você tem um computador quântico do mesmo tamanho, é impossível colocar em palavras o quanto mais potente será o computador quântico.

- E os benefícios dessa tecnologia?

Lisle - Quando conseguirmos resolver esses problemas, como nas ciências médicas, química e também, ciências sociais, os efeitos secundários como, por exemplo, novas drogas, o desenvolvimento de materiais novos, de todas essas áreas secundárias que se beneficiam da computação quântica, essas melhorias são o que as pessoas experimentarão.

- É possível executar esses cálculos em computação quântica agora?

Lisle - Ainda não.

- Estamos perto disso?

Lisle - Não tanto. Esse é o desafio da pesquisa científica: nós sabemos que é possível. É apenas uma questão de engenharia, de construir a máquina que realmente faça o que nós queremos que ela faça. Temos que desenvolver os materiais corretos; temos que ter certeza de que as técnicas estão corretas. Que as informações são suficientes. Nós sabemos que é possível teoricamente, que os princípios são aplicáveis, mas não temos ainda o avanço na engenharia para isso.

- É uma área de pesquisa que requer altos investimentos?

Lisle - Esse é o ponto nevrálgico, pois essa pesquisa precisa de investimentos que dependem dos governos ou das grandes corporações. Mas, progressos estão sendo feitos. Uma área de pesquisa muito promissora é a de Computação Quântica Topológica, uma subárea específica da computação quântica que tenta endereçar os problemas fundamentais da computação quântica, que são muito frágeis: se você insere na calculadora do seu telefone: 3+3, e o seu telefone pode cair no chão e, se não quebrar, o resultado ainda estará lá: 6. Na computação quântica, você coloca 3+3 e um vento sopra mais fortemente sobre a máquina, irá destruir a informação. Se luzes atingem a máquina, irão destruir a informação. É muito frágil. A computação quântica topológica está tentando focar isso como uma questão fundamental. Um engenheiro de sistemas é quem objetiva essa questão do início como a computação quântica nunca fez antes.

E quando, finalmente poderemos vislumbrar viver as melhorias que a computação quântica poderá trazer?

Lisle - Muitas pessoas perguntam isso, quando estaremos usando a computação quântica? Ainda não temos como responder. Podem ser daqui  cinco anos, ou cinquenta. Quem sabe?


A III Escola de Computação Quântica acontece até dia 7 de dezembro, no Depto. de Física (CCEN/UFPB). É uma realização da Associação Nacional para Inclusão Digital (Anid), do Governo do Estado da Paraíba, da Universidade Federal da Paraíba e Universidade Federal de Campina Grande; e tem apoio do Comitê Gestor da Internet no Brasil e do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (CGI.br/NIC.br).