Notícias

Censura na Internet


Políticos exigem censura da opinião pública pela Internet. Aprovação depende da presidência ou do STF

Reforma Eleitoral – Liberdade de expressão – Internet

Campanha Política – Censura – Provedores de conteúdo

O Senado aprovou ontem a inclusão no artigo 57-B no  Projeto de Lei da Câmara n° 110, de 2017 de um parágrafo pelo qual se obriga aplicativos e redes sociais a removerem conteúdo que entendam ser ofensivo ou contendo informação falsa em menos de 24 horas, sem necessidade de ordem judicial. Lei 9.504/1997 (Lei Eleitoral).

  • Autor da emenda: Deputado Aureo Ribeiro (SD/RJ).
  • Conteúdo: Permite a qualquer usuário obter a suspensão da publicação na Internet de conteúdo "de discurso de ódio, disseminação de informações falsas ou ofensa em desfavor de partido ou candidato" sem a necessidade de ordem judicial. Google, Facebook ou Twitter e outros serão obrigados a derrubar o conteúdo com base numa simples notificação, em até 24h e serão obrigadas a fazer a "identificação pessoal do usuário que a publicou".
  • Tempo que levou para ser votada pelo Senado: 5 horas
  • Tempo habitual médio que uma matéria tramita no Senado após aprovação na Câmara: 242 dias (Fonte: FGV Direito Rio)
  • Problema: A emenda fere a Constituição e o Marco Civil da Internet.
  • O que resta a fazer: Veto da Presidência da República ou ser considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.

Na opinião de Percival Henriques, presidente da Associação Nacional para Inclusão Digital (Anid) e conselheiro do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br):

- Esses ataques à Internet, na maioria das vezes, é uma tentativa pura e simples de garantir censura. E na questão da reforma eleitoral é ainda pior, pois se destina a proteger os políticos da opinião pública, contra o direito de expressão.

É tanto, que no parágrafo que foi aprovado e inserido no projeto ontem, pelo Senado, fala que basta existir alguma opinião da qual o político não se agrade para que ele reclame e exija a retirada imediata do conteúdo. Isso criaria um procedimento absurdo, sem a ação da Justiça para mediar a situação.

Se hoje a imprensa e os blogueiros já são pressionados através de processos judiciais, imagine exigir a retirada dos conteúdos sem ordem judicial. A Constituição garante a liberdade de expressão mas também o direito de resposta e, se comprovados os danos, a indenização; se a acusação for pertinente e depois do direito à defesa ter sido praticado, a Justiça vai punir. Mas não se pode tirar da Justiça o seu papel supremo de mediadora de conflitos. Somente a Justiça pode garantir o o processo legal e o direito à ampla defesa.

Durante a formulação do Marco Civil da Internet houve um amplo debate em torno da questão "Note, take down". O que é isso: tendo sido notificado, o provedor (de conteúdo) tem que baixar (retirar) o conteúdo. Foi uma questão polêmica. Na época, as entidades ligadas ao direito autoral defendiam a retirada do conteúdo, bastando uma notificação. O provedor deveria cumprir imediatamente.

Isso viola alguns princípios, por exemplo, a questão do juízo natural: quem decide as questões no Estado Democrático de Direito é a Justiça; caso contrário, não haverá espaço para o direito de defesa, para o contraditório, etc. No Marco Civil, ficou decidido que a retirada de conteúdo se daria apenas por ordem judicial, para garantir o andamento do processo, no sentido da defesa. Também não fere o princípio da inimputabilidade da rede. Ou seja, o provedor não é responsável pelo conteúdo que é publicado. O autor é o responsável. Acontece que nesses casos impensados, como nesse ponto da reforma eleitoral, a lei aponta para o provedor, como responsável por limpar as referências indesejadas na rede.

Pela assessoria, o deputado Aureo argumenta que "a emenda apresentada promete dar equilíbrio e transparência no uso das redes sociais".

O CGI.br emitiu nota pública sobre o tema ontem:

NOTA PÚBLICA em que expressa discordância a respeito da inclusão do parágrafo 6o no artigo 57-B da Lei 9.504/1997 (Lei Eleitoral), que obriga provedores de aplicações e de conteúdos na Internet a removerem conteúdo mediante simples notificação extrajudicial em até 24h.

O COMITÊ GESTOR DA INTERNET NO BRASIL – CGI.br, após tomar conhecimento, em 05 de outubro de 2017, da aprovação, na Câmara e no Senado, do Projeto de Lei da Câmara n° 110, de 2017, que modifica a Lei 9.504/1997 (Lei Eleitoral) no artigo 57-B, incluindo dois parágrafos pelos quais:  

a) “a denúncia de discurso de ódio, disseminação de informações falsas ou ofensa em desfavor de partido, coligação, candidato ou de habilitado conforme o art. 5o C, feito pelo usuário de aplicativo ou rede social na Internet, por meio do canal disponibilizado para esse fim no próprio provedor, implicará a suspensão, em no máximo vinte e quatro horas, da publicação denunciada até que o provedor certifique-se da identificação pessoal do usuário que a publicou, semfornecimento de qualquer dado dodenunciado ao denunciante, salvo por ordemjudicial”;  

vem a público:

1. Reiterar, no que couber, os posicionamentos expressados na “Nota de esclarecimento em razão do Relatório da CPI -Crimes Cibernéticos” e na “Nota Pública em que expressa discordância sobre o Projeto de Lei que propõe criação de Cadastro Nacional de Acesso à Internet’”, divulgadas, respectivamente, em05 de abril e 18 de outubro de 2016;

2. Destacar, novamente, a importância - para a Internet no Brasil - da garantia dos princípios que compõem o Decálogo do CGI.br, notadamente os princípios da liberdade de expressão, da privacidade dos cidadãos e da preservação da funcionalidade, segurança e estabilidade da rede, em plena consonância com o já estabelecido na Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet);

3. Esclarecer que o Marco Civil da Internet, em seu art. 19, assegura a qualquer interessado a possibilidade de exigir judicialmente a remoção de conteúdos online de qualquer natureza, inclusive de conteúdos ofensivos, falsos, ou de ódio, estabelecendo expressamente que a remoção forçada desses conteúdos deve sempre ocorrer pela via judicial; salvo nas duas únicas exceções previstas na legislação, a saber: imagens contendo cenas pornográficas ou de sexo explícito envolvendo crianças ou adolescentes (Lei 11829/08) ou imagens próprias de nudez vazadas sem o consentimento da vítima (art. 21 do Marco Civil), sendo certo, também, que a Justiça Eleitoral possui mecanismos muito céleres para o pronto atendimento de pedidos que dizem respeito a violações às leis eleitorais, devendo sua competência institucional ser respeitada e prestigiada.

4. Pelos motivos acima expostos, o CGI.br recomenda que seja vetada a inclusão do parágrafo 6o no artigo 57-B da Lei Eleitoral, tendo em vista que essas alterações criam enorme insegurança jurídica, dificultam a tutela de direitos e garantias fundamentais e comprometem o desenvolvimento da Internet no país.

(Foto: Wikipedia)