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Visão virtual


TICs auxiliam na educação de alunos cegos

A estudante paraibana Elisabeth Cardoso, o monitor Ibraim dos Santos Pereira, e tantos outros alunos cegos vislumbram novas oportunidades de crescimento pessoal depois de começarem a usar as tecnologias de comunicação (TICs). A ciência tem ajudado a quebrar a barreira do isolamento e a potencializar o aprendizado. O problema é que, mesmo trazendo tantos benefícios, o uso das tecnologias pelos alunos cegos nas escolas ainda é incipiente e estudantes desejam mais tempo de acesso aos recursos. E mais, especialistas falam na necessidade de formação dos professores para atender melhor essas crianças.

No Brasil são 53.178 pessoas que não conseguem enxergar as belezas do lugar onde vivem e quase 3 milhões enxergam com dificuldade. No estado da Paraíba são 8.447 deficientes visuais (IBGE 2010), sendo 1.126 crianças em idade escolar.

A coordenadora de Educação Especial da Prefeitura Municipal de João Pessoa, Suzi Belarmino, informa que dentre os mil alunos da Capital paraibana, cerca de 80 são deficientes visuais totais ou com baixa visão. Ela ressalta o papel das TICs na inclusão e no desenvolvimento desses estudantes.

- Hoje sabemos que as pessoas cegas usam a tecnologia em pé de igualdade. O computador, por exemplo, tem um leitor de tela. O teclado é comum. Os softwares leitores de tela, o correio eletrônico, os jogos educativos virtuais também são ferramentas importantes para o ensino educacional dos cegos – enfatiza a coordenadora.

Para o presidente da Associação Nacional para Inclusão Digital (Anid), Percival Henriques, a inclusão digital só acontece quando atinge todos os públicos. “O desenvolvimento da tecnologia permitiu maior acessibilidade, mas essa tecnologia tem que chegar até aqueles que precisam. Ainda temos no Brasil cerca de 100 milhões de pessoas que não acessam a Internet, além daquelas que podem acessar mas precisam de sites adaptados para as suas necessidades, como é o caso dos cegos”, defende o presidente da Anid.

Em João Pessoa alunos cegos têm escola adaptada

Em João Pessoa, a Escola Municipal General Rodrigo Otávio foi eleita pela prefeitura para abrigar os alunos com cegueira total devido a estrutura e a tradição que tem para acessibilidade desses estudantes. Outra vantagem: a escola fica perto do Instituto dos Cegos da Paraíba, onde se aprende a viver com autonomia e independência, apesar da deficiência.

- Nós preferimos ter uma escola pólo para deficientes visuais totais e concentrá-los ali. Ela dispõe de uma sala recursos multifuncionais, com impressora braile e outros equipamentos. É próxima do Instituto dos Cegos Adalgisa Cunha, onde os alunos continuam o aprendizado em vivência, para serem independentes. Existe toda uma integração para com a comunidade, destaca Suzi. Os alunos com cegueira total são conduzidos a esta escola com transporte escolar acessível. A faixa etária desses alunos é entre 6 e 18 anos.

A professora Rosália Neves Silva, é uma das responsáveis por conduzir as atividades pedagógicas na sala de recursos multifuncionais. Ela é especializada em trabalhar com alunos deficientes visuais. Outros três professores atuam em conjunto, na coordenação desta sala. Os três são cegos.

- Os alunos usam os computadores e a Internet nesta sala e isso para eles foi um avanço. Tem aluno cego que faz pesquisa sozinho na Internet - explica a professora Rosália - Mas não temos computador nas salas de aulas.

Segundo ela, alguns professores enviam conteúdo via e-mail para alunos cegos. Mas nem todos fazem isso. Os alunos que não possuem computador em casa ficam excluídos dessa facilidade e o aprendizado torna-se mais lento.

A aluna Elizabeth Cardoso, 15 anos, do 8º ano, fala sobre essa dificuldade. Desde os 8 anos ela é deficiente visual.

- As coisas que os professores escrevem no quadro, já que a gente não vê, se eles enviassem para o nosso e-mail, nós poderíamos ler. Já que os alunos na sala fazem muito barulho e às vezes não conseguimos ouvir o professor falando, então, ficaria bem mais fácil, pois não precisaríamos tanto de silêncio se tivéssemos com notebook e fone de ouvido. Seria bom - conclui a estudante.

Questionada acerca da contribuição da tecnologia digital na educação, Elisabeth diz que “vai ficar bem mais fácil.” Ela destaca que se os alunos cegos tivessem acesso às TICs na rotina de sala de aula, não precisariam escrever tudo em braile, o que exige um esforço maior e toma muito tempo.

Mesmo com recursos tecnológicos a escola mantém o uso do braile. Rosália insiste na importância do aprendizado do alfabeto dos cegos.

- Nas aulas nós lemos e escrevemos em braile, afirma. O uso dessa linguagem é fundamental pelos cegos. Normalmente, ao prepararmos as aulas, passamos todo o material escolar para o braile um dia antes e os alunos cegos recebem no dia da aula. Nisso a tecnologia ajuda também, uma impressora braile é cara e o papel é especial. Há, por exemplo, mapas em alto relevo para as aulas de geografia - completa a professora Rosália.

O acesso à tecnologia fica restrito às aulas na sala de recursos.

- É ali que aprendemos a usar o teclado do notebook e o NVDA (leitor de tela para computador e celular). Estamos aprendendo a escrever textos no computador! - comemora a aluna Elisabeth.

Estudante cego descobre oportunidades com as TICs

Ibraim dos Santos Pereira passou a infância na zona rural do município de Sapé sem conseguir enxergar muita coisa. Ele nasceu com baixa visão, enxerga muito pouco com um olho e nada com o outro. Não sabe por quê. “Eu ia à escola, mas não conseguia aprender nada”, conta. Em 2004, aos 13 anos, ele se mudou para João Pessoa com a família, começou a frequentar o Instituto dos Cegos e a ter aulas de informática no próprio instituto. Foi quando percebeu que havia muitas oportunidades ao seu redor e que sua vida poderia tomar um rumo em direção ao crescimento pessoal.

Ele estudou e aprendeu a buscar na Internet as repostas para todas suas curiosidades. Sem enxergar o que está na tela do computador, Ibraim ouve o leitor de tela numa velocidade tão rápida que parece outra língua, para quem não está habituado. Agora, aos 24 anos, ele ensina os macetes do computador para outros colegas cegos no Instituto e vai fazer o Enem.

- Eu me formei no Ensino Médio e agora quero fazer Rede de Computadores. Adoro informática. No começo foi estranho... Mas logo aprendi e me acostumei - falou.

Com a mesma destreza com que mexe no computador, Ibraim opera o smartphone. Com o avanço da tecnologia os aparelhos estão cada vez mais com funções de acessibilidade e os sistemas IOS e Android contam com leitores de tela.

- Eu ainda prefiro o IOS, porque dá pra gente configurar por conta própria. Com o Android eu precisei de ajuda pra configurar - explicou Ibraim dos Santos.

Especialista avalia o uso das TICs na educação

Para a coordenadora do Grupo de Pesquisa em Jornalismo, Mídia, Acessibilidade e Cidadania da Universidade Federal da Paraíba (GJAC/UFPB) Joana Belarmino, as TICs são grandes facilitadoras da inclusão social, são fundamentais em todas as fases de ensino, auxiliam os estudantes cegos na interação com os colegas, mas os procedimentos ainda estão “engatinhando” nas escolas, não só no uso dos equipamentos como na formação dos professores.

- As instituições precisam investir na formação dos educadores, e na criação de uma cultura aberta ao uso das TICs. As novas tecnologias contribuem com o aprendizado dos alunos cegos na mesma proporção que contribuem para o aprendizado dos alunos não cegos. Propiciam a aquisição de competências indispensáveis no mundo moderno”, avalia Joana Belarmino.

Ela chama a atenção para a continuidade do ensino do braile, pois há equipamentos como a linha braile onde os textos são decodificados. Da mesma forma, o texto pode ser escrito em braile no teclado da linha e o aparelho o transforma em .txt (arquivo de texto).

- As tecnologias devem ser complementares ao ensino do braile, da matemática, do domínio das línguas. Para uma crianças cego-surda por exemplo, uma tecnologia como a linha braile, que substitui a tela do computador e codifica todos os conteúdos em na linguagem dos cegos, é fundamental para o aprendizado - avalia.

Nesse universo tecnológico, o que ainda falta ser desenvolvido é o acesso às imagens. A audiodescrição, que é a descrição de imagens em pistas verbais, ainda não está disseminada no plano da Internet e das tecnologias em geral formando uma barreira à acessibilidade.

- Mas a síntese de voz é uma grande ferramenta que permite uma interação em pé de igualdade, explica Joana Belarmino, referindo-se aos softwares leitores de tela.

A pesquisadora ainda destaca que o mercado para o desenvolvimento de ferramentas tecnológicas para o público infantil com deficiência ainda é incipiente:

- Poderiam ser criados mais produtos, poderiam ser criados selos de incentivo e premiações. Isso reforçaria essa inserção com qualidade e variedade de ferramentas.